sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

UMA LUZ QUE BRILHARÁ



NATAL DO SENHOR (NOITE)

Is 9,1-3.5-6; SI 95; Tt 2,11-14; Lc 2,1-14
Segundo as escrituras, Jesus nasce á noite, no romper da aurora de um novo dia (Lc 2,8). Essa referência ao momento do nascimento de Jesus não se refere propriamente ao horário, tempo, mas ao novo que ele vem inaugurar. Seu nascimento carrega não só nossa esperança, mas instaura de forma definitiva, na história, a salvação que Deus nos preparou. Por essa razão, a memória do nascimento de Jesus (encarnação) liga-se à memória de sua ressurreição, pela qual, por seu livre e espontâneo desejo, Deus nos comunica sua vida. Cristo está no centro do mistério da redenção: por ele Deus se faz humano e, também nele e por ele, a humanidade se torna divina, isto é, família dos(das) filhos(as) de Deus!
Um messias de reconciliação
O anúncio do nascimento de um salvador requer que seus destinatários assumam nova postura, fugindo à passividade. O texto de Isafas proclamado na liturgia do natal está impregnado de referências a guerras, batalhas, violência. Vive-se uma expectativa de salvação aos moldes exigidos pelo conflito: um salvador guerreiro.
No entanto, o texto desenvolve-se num sentido diferente. O salvador esperado opõe a luz (vida/justiça) às trevas (guerras/conflitos). Sua batalha não se desenvolve no sentido de destruir a vida de seus oponentes. A ação do salvador esperado destrói os elementos de morte e violência (v. 3-4). Ele não tem a força de um soldado, mas a fragilidade e ternura de uma criança (v. 5), características com as quais poderá reunir os povos.
Sua presença não incita as partes ao combate, mas à reconciliação. Por isso, seus títulos - conselheiro admirável, Deus forte, pai dos tempos futuros, príncipe da paz - dão o sentido de sua salvação. A vitória não se dará na perspectiva de gente destruindo gente, mas numa batalha pessoal. Cada pessoa deverá superar sua sede de poder e de riqueza, colocando-se em atitude de diálogo, aproximação e reconciliação. Não será o reinado da dominação dos mais fortes sobre os mais fracos. Será tempo da fraternidade, compreendida como justiça e santidade (v. 6), com as quais uns se preocupam com os outros, deixando de se ver como inimigos.
A paz conquistada pela força das armas é sempre uma paz instável. Ela comporta a submissão de pessoas, povos que é fermento de revolta e combustível para novas batalhas. A estabilidade do reino de paz do messias não vem de sua força guerreira. Sua força está no amor que move os corações para o bem, para a fraternidade. Por isso, em última instância, Deus será a garantia da paz definitiva.
Nascido entre os pequenos
A narrativa do nascimento de Jesus, em Lucas, segue algumas características da profecia de Isafas. A referência ao recenseamento mostra uma situação de exploração e de instabilidade, porque a contagem da população servia para o cálculo dos impostos e para o recrutamento de soldados. Por isso, na ótica dos romanos vivia-se uma guerra e do lado dos dominados experimentava-se a opressão.
Essa situação gerava instabilidade nas famílias. Maria, mesmo estando grávida, tem de se deslocar com José para Belém, centro do orgulho de Israel. No entanto, ali não encontra lugar (v. 7c). O casal tem de se «virar” na periferia da vida. O relato cresce em sentido inverso do que se esperava em Jerusalém. O silêncio e a escuridão da manjedoura se contrastam com as pompas e luxo da corte. É nesse ambiente escondido que Cristo nasce.
De forma breve o texto nos diz: ‘Maria deu à luz o seu filho primogênito. Ela o enfaixou e o colocou na manjedoura” (v. 7ab). Ele nasce na normalidade da vida dos pobres. Aí, não existe aparente novidade, a não ser as esperanças e expectativas normais que o nascimento de uma criança pode trazer. Parece que Lucas, ao descrever essa cena, deseja convidar-nos a nascer de novo com Cristo. Deixar nossas riquezas e posições e fazer a caminhada para Belém. Ver e encarar a realidade e a vida com os olhos dos simples. Deus é simples e nos quer simples.
A imagem triunfal do anúncio do Anjo aos pastores contrasta-se com a cena do presépio escondido em que está depositado o salvador da humanidade. A situação do presépio é a mesma dos pastores. Dormem ao relento na escuridão, misturados com os animais. É o olhar dessa gente que ali na escuridão da vida, em sua simplicidade e necessidade, conseguirá ver naquele recém-nascido o salvador do mundo (glória de Deus). É o jeito de Deus se revelar: fazer brotar vida e dignidade onde a esperança agoniza. Esse é o sentido do deslocamento do brilho e da luz. Não é o presépio que se encontra no escuro. A corte romana e sacerdotal encontra-se no escuro. Cega por interesses de poder e riquezas não será capaz de ver, na simplicidade da vida, um Deus que se revela e vem ao encontro dos simples e pequenos. O nasciment.o de Jesus torna-se para eles convite à conversão e, para os pastores, esperança de redenção.
Jesus nos revela o rosto da humanidade
O nascimento de Jesus, associado à sua ressurreição, é a plena revelação de Deus para nós. A vinda dele entre nós revela não só o rosto de Deus, mas também o rosto da humanidade. Ele vem trazer a salvação universal (2a leitura), porém, para que a humanidade se aproprie dessa salvação, deverá passar por um processo de purificação (v. 13). Abandonar a impiedade e as paixões mundanas. Viver com equilíbrio, justiça e piedade. Elementos fundamentais de uma esperança ativa, que não se acomoda com a fraqueza e debilidade da humanidade.
A celebração do Natal é convite à simplicidade, fraternidade, paz. Não é mera esperança de mudança de estruturas ou coisas. Ela nos pede mudança de coração. O Deus eterno se faz humano para olhar as coisas com os nossos olhos. Somos, assim, chamados á proximidade de Deus, para acolhê-lo em nossa vida e ver tudo com olhar amoroso, que nos faz ter o mesmo olhar de Deus. Antes de ser festa de presentes e outras coisas, a celebração do Natal que ser festa da vida e da esperança de vida para todos, assim como Deus quer.

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