ELES VOS PRECEDERÃO NO REINO DE DEUS
A liturgia do 26º Domingo do Tempo Comum
deixa claro que Deus chama todos os homens e mulheres a empenhar-se na
construção desse mundo novo de justiça e de paz que Deus sonhou e que quer
propor a todos os homens. Diante da proposta de Deus, nós podemos assumir duas
atitudes: ou dizer “sim” a Deus e colaborar com Ele, ou escolher caminhos de
egoísmo, de comodismo, de isolamento e demitirmo-nos do compromisso que Deus
nos pede. A Palavra de Deus exorta-nos a um compromisso sério e coerente com
Deus – um compromisso que signifique um empenho real e exigente na construção
de um mundo novo, de justiça, de fraternidade, de paz.
Na primeira leitura, o profeta Ezequiel
convida os israelitas exilados na Babilónia a comprometerem-se de forma séria e
conseqüente com Deus, sem rodeios, sem evasivas, sem subterfúgios. Cada crente
deve tomar consciência das conseqüências do seu compromisso com Deus e viver,
com coerência, as implicações práticas da sua adesão a Jahwéh e à Aliança.
O Evangelho diz como se concretiza o
compromisso do crente com Deus… O “sim” que Deus nos pede não é uma declaração
teórica de boas intenções, sem implicações práticas; mas é um compromisso
firme, coerente, sério e exigente com o Reino, com os seus valores, com o
seguimento de Jesus Cristo. O verdadeiro crente não é aquele que “dá boa
impressão”, que finge respeitar as regras e que tem um comportamento
irrepreensível do ponto de vista das convenções sociais; mas é aquele que
cumpre na realidade da vida a vontade de Deus.
A segunda leitura apresenta aos cristãos
de Filipos (e aos cristãos de todos os tempos e lugares) o exemplo de Cristo:
apesar de ser Filho de Deus, Cristo não afirmou com arrogância e orgulho a sua
condição divina, mas assumiu a realidade da fragilidade humana, fazendo-se
servidor dos homens para nos ensinar a suprema lição do amor, do serviço, da
entrega total da vida por amor. Os cristãos são chamados por Deus a seguir
Jesus e a viver do mesmo jeito, na entrega total ao Pai e aos seus projetos.
1ª leituraEzequiel 18,25-28
Na verdade, os membros do Povo de Deus que
estão exilados na Babilónia não podem “sacudir a água do capote” e presumir de
justos e inocentes: não há justos e inocentes neste processo, uma vez que
todos, sem exceção, são responsáveis por atitudes de infidelidade a Jahwéh e de
desrespeito pelos seus mandamentos. Fará algum sentido que os exilados acusem
Jahwéh de ser injusto, depois de terem violado sistematicamente a aliança e
terem cometido tantos pecados e infidelidades (vers. 25)?
Para além disso, Israel não pode continuar
a esconder-se atrás de uma responsabilidade coletiva, que implica todos, mas
não responsabiliza ninguém. Chegou a altura de cada membro do Povo de Deus se
sentir pessoalmente responsável diante de Deus pelas suas ações e pelos
compromissos assumidos no âmbito da Aliança. Cada membro do Povo de Deus tem de
descobrir que, quando fizer escolhas erradas e se obstinar nelas, sofrerá as conseqüências;
e que quando abandonar os caminhos de egoísmo e de pecado e optar por Deus e
pelos seus valores encontrará a vida (vers. 26-28).
Significa isto que o pecado de um membro
da comunidade não afeta os outros irmãos, membros da mesma comunidade? É claro
que afeta. O pecado introduz sempre elementos de desequilíbrio, de desarmonia,
de egoísmo, de ruptura, que atingem todos aqueles que caminham conosco… Mas o
que Ezequiel aqui pretende sublinhar é que cada homem ou mulher tem de
sentir-se pessoalmente responsável diante de Deus pelas suas opções e pelos
seus atos.
Esta superação da mentalidade coletiva, dando lugar à responsabilidade individual, é um dos grandes progressos na história teológica de Israel. Doravante, o Povo aprenderá a reagir em termos individuais e não em termos de massa. Está aberto o caminho para uma Nova Aliança: uma Aliança que não é feita genericamente com uma comunidade, mas uma Aliança pessoal e interior, feita com cada crente.
Esta superação da mentalidade coletiva, dando lugar à responsabilidade individual, é um dos grandes progressos na história teológica de Israel. Doravante, o Povo aprenderá a reagir em termos individuais e não em termos de massa. Está aberto o caminho para uma Nova Aliança: uma Aliança que não é feita genericamente com uma comunidade, mas uma Aliança pessoal e interior, feita com cada crente.
2ª leitura Filipenses 2,1-11
Na primeira parte (vers. 1-5), Paulo, em
tom solene, pede aos altivos romanos que constituem a comunidade de Filipos que
não se deixem dominar pelo orgulho, pela auto-suficiência, pela vaidade, pela
ambição, que só provocam egoísmo e divisão. Recomenda-lhes que vivam unidos,
que se amem e que sejam solidários, pois foi isso que Cristo, não só com
palavras, mas com a própria vida, ensinou aos seus discípulos.
Na segunda parte (vers. 6-11), Paulo vai
referir-se, com mais pormenor, ao exemplo de Cristo. Para apresentar esse
exemplo, Paulo recorre, então, ao tal hino litúrgico, que celebrava a “Kenosis”
(“despojamento”) de Cristo e a sua exaltação.
Cristo Jesus – nomeado no princípio, no
meio e no fim – constitui o motivo do hino. Dado que os Filipenses são
cristãos, quer dizer, dado que Cristo é o protótipo a cuja imagem estão
configurados, têm a iniludível obrigação de comportar-se como Cristo.
O hino começa por aludir sutilmente ao
contraste entre Adão (o homem que reivindicou ser como Deus e lhe desobedeceu –
cf. Gn 3,5-22) e Cristo (o Homem Novo que, ao orgulho e revolta de Adão
responde com a humildade e a obediência ao Pai). A atitude de Adão trouxe
fracasso e morte; a atitude de Jesus trouxe exaltação e vida.
Em traços precisos, o hino define o
“despojamento” (“kenosis”) de Cristo: Ele não afirmou com arrogância e orgulho
a sua condição divina, mas aceitou fazer-Se homem, assumindo com humildade a
condição humana, para servir, para dar a vida, para revelar totalmente aos
homens o ser e o amor do Pai. Não deixou de ser Deus; mas aceitou descer até
aos homens, fazer-Se servidor dos homens, para garantir vida nova para os
homens. Esse “abaixamento” assumiu mesmo foros de escândalo: Ele aceitou uma
morte infamante – a morte de cruz – para nos ensinar a suprema lição do
serviço, do amor radical, da entrega total da vida.
No entanto, essa entrega completa ao plano do Pai não foi uma perda nem um fracasso: a obediência e entrega de Cristo aos projetos do Pai resultaram em ressurreição e glória. Em conseqüência da sua obediência, do seu amor, da sua entrega, Deus fez d’Ele o “Kyrios” (“Senhor” – nome que, no Antigo Testamento, substituía o nome impronunciável de Deus); e a humanidade inteira (“os céus, a terra e os infernos”) reconhece Jesus como “o senhor” que reina sobre toda a terra e que preside à história.
No entanto, essa entrega completa ao plano do Pai não foi uma perda nem um fracasso: a obediência e entrega de Cristo aos projetos do Pai resultaram em ressurreição e glória. Em conseqüência da sua obediência, do seu amor, da sua entrega, Deus fez d’Ele o “Kyrios” (“Senhor” – nome que, no Antigo Testamento, substituía o nome impronunciável de Deus); e a humanidade inteira (“os céus, a terra e os infernos”) reconhece Jesus como “o senhor” que reina sobre toda a terra e que preside à história.
É óbvio o apelo à humildade, ao desprendimento,
ao dom da vida que Paulo faz aos Filipenses e a todos os crentes: o cristão
deve ter como exemplo esse Cristo, servo sofredor e humilde, que fez da sua
vida um dom a todos; esse caminho não levará ao aniquilamento, mas à
glorificação, à vida plena.
Evangelho Mateus 21,28-32
A parábola dos dois filhos ilustra duas
atitudes diversas diante dos desafios e das propostas de Deus.
O primeiro filho foi convidado pelo pai a trabalhar “na vinha”. A sua primeira resposta foi negativa: “não quero”. No contexto familiar da Palestina do tempo de Jesus, trata-se de uma resposta totalmente reprovável, particularmente porque uma atitude deste tipo ia contra todas as convenções sociais… Enchia um pai de vergonha e punha em causa a sua autoridade diante dos familiares, dos amigos, dos vizinhos. No entanto, este primeiro filho acabou por reconsiderar e por ir trabalhar na vinha (vers. 28-29).
O primeiro filho foi convidado pelo pai a trabalhar “na vinha”. A sua primeira resposta foi negativa: “não quero”. No contexto familiar da Palestina do tempo de Jesus, trata-se de uma resposta totalmente reprovável, particularmente porque uma atitude deste tipo ia contra todas as convenções sociais… Enchia um pai de vergonha e punha em causa a sua autoridade diante dos familiares, dos amigos, dos vizinhos. No entanto, este primeiro filho acabou por reconsiderar e por ir trabalhar na vinha (vers. 28-29).
O segundo filho, diante do mesmo convite,
respondeu: “vou, sim, senhor”. Deu ao pai uma resposta satisfatória, que não
punha em causa a sua autoridade e a sua “honra”. Ficou bem visto diante de
todos e todos o consideraram um filho exemplar. No entanto, acabou por não ir
trabalhar na vinha (vers. 30).
A questão posta, em seguida, por Jesus, é:
“qual dos dois fez a vontade do pai?” A resposta é tão óbvia que os próprios
interlocutores de Jesus não têm qualquer receio em dá-la: “o primeiro” (vers.
31).
A parábola ensina que, na perspectiva de
Deus, o importante não é quem se comportou bem e não escandalizou os outros;
mas, de acordo com a lógica de Deus, o importante é cumprir, realmente, a
vontade do pai. Na perspectiva de Deus, não bastam palavras bonitas ou
declarações de boas intenções; mas é preciso uma resposta adequada e coerente
aos desafios e às propostas do Pai (Deus).
É certo que os fariseus, os sacerdotes, os
anciãos do Povo, disseram “sim” a Deus ao aceitar a Lei de Moisés… A sua
atitude – como a do filho que disse “sim” e depois não foi trabalhar para a
vinha – foi irrepreensível do ponto de vista das convenções sociais; mas, do
ponto de vista do cumprimento da vontade de Deus, a sua atitude foi uma
mentira, pois recusaram-se a acolher o convite de João à conversão. Em
contrapartida, aqueles que, de acordo com o “política e religiosamente correto”
disseram “não” (por exemplo, os cobradores de impostos e as prostitutas),
cumpriram a vontade do Pai: acolheram o convite de João à conversão e acolheram
a proposta do Reino que Jesus veio apresentar (vers. 32).
Lida no contexto do ministério de Jesus,
esta parábola dava uma resposta àqueles que O acusavam de acolher os pecadores
e os marginais – isto é, aqueles que, de acordo com as “convenções”, disseram
não a Deus. Jesus deixa claro que, na perspectiva de Deus, não interessam as
convenções externas, mas a atitude interior. O que honra a Deus não é o que
cumpre ritos externos e que dá “boa impressão” às massas; mas é o que cumpre a
vontade de Deus.
Mais tarde, a comunidade de Mateus leu a mesma parábola numa perspectiva um pouco diversa. Ela serviu para iluminar a recusa do Evangelho por parte dos judeus e o seu acolhimento por parte dos pagãos. Israel seria esse “filho” que aceitou trabalhar na vinha mas, na realidade, não cumpriu a vontade do Pai; os pagãos seriam esse “filho” que, aparentemente, esteve sempre à margem dos projetos do Pai, mas aceitou o Evangelho de Jesus e aderiu ao Reino.
Mais tarde, a comunidade de Mateus leu a mesma parábola numa perspectiva um pouco diversa. Ela serviu para iluminar a recusa do Evangelho por parte dos judeus e o seu acolhimento por parte dos pagãos. Israel seria esse “filho” que aceitou trabalhar na vinha mas, na realidade, não cumpriu a vontade do Pai; os pagãos seriam esse “filho” que, aparentemente, esteve sempre à margem dos projetos do Pai, mas aceitou o Evangelho de Jesus e aderiu ao Reino.