segunda-feira, 27 de outubro de 2014

IR AO ENCONTRO DA VIDA!


COMEMORAÇÃO DE TODOS FIÉIS DEFUNTOS - FINADOS

 

  O ano litúrgico, em relação a Cristo, tem seu ápice na celebração do mistério pascal durante o tríduo e o tempo pascal. No entanto, o mistério de Cristo ressuscitado deve ser vivido e alimentado no ordinário da experiência humana, pois foi em sua natureza humana que Ele revelou ser o Filho de Deus. Dessa forma, experimentando em sua própria morte a finitude da condição humana, Jesus nos aponta que nossa morte, assumida por Deus, abre para nós a eternidade da salvação.
Meu Redentor está vivo...
A pobreza, a doença e os infortúnios da vida, para o homem do Antigo Testamento, são vistos como mal, cujo ápice encontra-se na morte, que representa o fim de tudo. Esse pressuposto, aliado à perspectiva da retribuição divina, leva as pessoas a ler os sofrimentos na perspectiva da culpa e as alegrias como recompensa pelo bem e fidelidade.
Como falar do sofrimento sem sentido, em que a consciência humana não aponta para alguma culpa? Essa é a questão que o livro de Jó procura refletir. Durante o diálogo que mantém com seus amigos, ele alega sua inocência ante a insistência deles em vê-lo como pecador castigado por seus erros. A pressão que os defensores da retribuição fazem desperta em Jó um sentimento de abandono, que o leva mesmo a fraquejar na esperança, não percebendo no nível da humanidade qualquer indício de piedade ou misericórdia.
Certo de sua inocência, Jó vê a condição humana fadada ao fracasso (pele destruída). É dessa realidade que ele é chamado a dar um salto qualitativo. Permanecer no horizonte humano das compensações significa render-se à fatalidade da morte. Projetando seu olhar para além dos acontecimentos, ele contempla Deus em sua eternidade (ferro, chumbo). Se Deus é o redentor, o resgatador do ser humano, Ele não pode conhecer a morte. Dentro de seu sofrimento, mesmo condicionado pela morte, Jó conclui que o ser humano, abrindo-se para Deus (ver face a face), nele encontrará a resposta para seus sofrimentos. O horizonte de Deus é sempre abertura de vida, nunca de morte. Ver a Deus na carne, então, significa andar na vida iluminado pela esperança da salvação que dele nos vem.
Vem para fora...
No evangelho de João, antecipando sua própria ressurreição, Jesus ressuscita Lázaro (11,41-44) e revela sua missão de salvação. A referência ao tempo (quatro dias), à distância (três quilômetros) e às pessoas dão o colorido fúnebre da realidade: de fato a morte era o fim de Lázaro e, por conseguinte, da segurança de suas irmãs.
Ao anúncio da chegada de Jesus, Marta vai a seu encontro, enquanto Maria permanece sentada. A ressurreição tem de ser experimentada como processo de sair de si e ir ao encontro de quem pode oferecer vida (Cristo). Permanecer sentado é resignar-se à morte e crer que nem Deus poderá superá-la.
Marta desafia Jesus: se estivesses aqui (v. 21). A essa interpelação corresponde a resposta de Jesus — Eu sou a ressurreição e a vida (v. 25- 26). Ou seja, a ressurreição não é algo intangível a ser experimentado num futuro incerto (último dia, v. 22-24). Jesus não estava ausente (três quilômetros). Quem vai ao encontro dele e se abre ao seu amor (amizade), já experimenta a ressurreição.
Lázaro morreu e permanecerá morto se recusar ir ao encontro de Jesus. Na medida de nossa abertura a Cristo, mesmo que conheçamos a morte, nele experimentaremos a eternidade de Deus (v. 25b). Marta dá a premissa básica: a ausência de Deus significa morte — se estivesses aqui... No entanto, a insignificante distância entre Jesus e Lázaro (três quilômetros) a ser transposta não significa que Cristo se faz ausente ou se distancia, mas corresponde à recusa do ser humano de ir ao seu encontro.
Ir ao encontro de Jesus, como Marta, significa deixar-se rnterpelar por ele para chegar à fé. Marta realiza uma profissão de fé (v. 27) semelhante a de Pedro (Mt 16,16), porem vai alem da perspectiva fisico-espacial-estrutural, porque cre que Deus transcende a historia Então, lida na perspectiva da fe, a ressurreição de Lazaro e a nossa ressurreição Jesus, como nosso Redentor vivo, esta sempre a porta de nossos tumulos (sofrimentos, pecados, egoismos, injustiças, doenças morte) a nos convidar para sairmos de la Quem se deixar interpelar e caminhar em sua direção, experimentara a vida.
Nossa ressurreição
A celebração da memoria dos fieis defuntos não significa culto a morte A tradição cristã, ao ter presente a memoria de nossa finitude, quer levar-nos a esperança de nossa vitoria sobre a morte em Cristo Ele é o nosso Redentor que, superando a morte, resgatará da morte todo aquele que crê.
Percebemos, dessa forma, um crescendo no anó litúrgico A centralidade de Cristo e de seu Mistério Pascal culmina para seus seguidores na participação deles em sua eternidade, vivenciada liturgicamente na Festa de Tõdos os Santos e de Cristo Rei. A celebração de finados, portanto, reafirma a presença de Cristo junto aos nossos túmulos (morte física e espiritual), convidando-nos à participação na vida que não fenece, na eternidade, onde Deus será tudo em todos.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

30° DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A

O NOVO MANDAMENTO DO AMOR  

Ex 22,20-26; SÍ 17; 1Ts 1,5c-10; Mt 22,34.40

 A experiência da precariedade da vida deve levar as pessoas à liberdade do agir. Quem passa pelo sofrimento e pela experiência da dor, deseja libertar-se. Todavia, a libertação só será autêntica se, progredindo na liberdade, a pessoa superar o complexo de vítima e o desejo de revanche, assumindo a postura de solidariedade ante os sofredores e de misericórdia ante o arrependimento de quem erra. A prática da justiça, para quem crê, transita nessas duas bitolas: solidariedade e misericórdia.
Porque misericordioso...
O livro do Êxodo usa o Egito não como entidade espaço-geográfica, mas como categoria teológica. Entendido sob esse prisma, o Egito pode existir mesmo em Israel. Esse elemento aparece com força no texto da liturgia de hoje. Estrangeiro — viúva — órfão são três classes de pessoas cuja situação socioeconômica e política as iguala à situação de Israel no Egito. A opressão a essas pessoas desloca o Egito para Israel. Em consequência, se Deus agiu contra o Egito para libertar Israel, da mesma forma agirá contra Israel para libertar essas pessoas. Essa advertência do texto bÍblico não é uma ameaça a Israel. É um chamado à consciência. Por ter passado pelo sofrimento, Israel é convidado a superar quaisquer formas de opressão e a viver a solidariedade para com aqueles que em seu meio vivem em condições de precariedade.
O texto também faz referência às relações econômicas de empréstimo e penhora de bens. Emerge como objeto de exploração, nessas relações, o pobre que, tanto no caso de empréstimo, como no de penhora de bens, entra por necessidade. A exploração dos pobres por juros ou pela expropriação de seus bens é vista como injustiça. Certamente a referência a esse tipo de relações evidencia uma realidade que ocorria em Israel. Voltando seu olhar para o pobre, Deus lê os fatos a partir de sua condição. Eles não devem ser punidos por sua condição, mas gozarem da misericórdia de quem os socorre. De forma pedagógica, o autor sagrado quer fazer emergir a imagem e a missão de Israel como povo de Deus. É sempre importante ter presente que, para ser povo eleito ou povo de Deus, Israel também tem de escolher Deus e sua justiça, manifestando isso pela misericórdia e pela prática da caridade para com os pobres.
Amarás...
Jesus continua sendo desafiado por seus algozes religiosos. “Perfeitos” no cumprimento da lei, vista como salvadora, os fariseus testam Jesus indagando sobre o maior mandamento. A resposta. de Jesus toca na raiz de todas as práticas da fé. Ele não se baseia na lei, porque ela, como mediação, não tem força de salvação. O que coloca o crente no caminho da salvação é o espírito com que se abre a Deus e coloca em prática os mandamentos.
Resumir os mandamentos no amor a Deus e ao próximo reflete o caráter simples de Deus. Déus  salva por amor, por isso vem ao encontro do ser humano. Nesse sentido, o amor de Deus não é abstrato, mas manifesta-se na comunicação da vida a cada ser vivo e na aproximação dele em relação à humanidade. Dessa forma, podemos afirmar a existência do único e fundamental mandamento do amor. Se Deus nos ama doando-nos a vida e nos salvando, então, amar a Deus significa amar igualmente ao próximo. Não se ama ao próximo porque se ama a Deus. Se o amor ao próximo é a expressão concreta do amor a Deus, não amá-lo significa que-nunca se amou a Deus.
As práticas religiosas têm por finalidade levar à consciência de Deus e de nossa necessidade de amá-lo. Dessa forma, práticas e mentalidades religiosas rápidas em julgar e condenar pessoas, utilizando-se inclusive de violência e de difamação, não passam de um engodo, apresentando uma falsa imagem de Deus. O problema do farisaísmo não é a questão do desejo de Deus, mas o da absolutização de uma imagem de Deus, excluindo todas as outras experiências de fé, sem abertura para a misericórdia e o diálogo. O amor é mandamento único, porque jamais exclui alguém, acolhendo a todos os que se abrem para acolher Deus e o próximo.
Acolher o amor...
A fé manifesta-se como acolhida ao amor de Deus para conosco. Recusar o amor significa voltar para o Egito e permitir que as injustiças e as forças de morte atuem na historia. O verdadeiro amor não e uma ideia abstrata ou sentimento de posse. É atitude de quem vive os valores do Reino como norma de vida. O testemunho de fé transcende fronteiras, porque, enquanto acolhida da Palavra na alegria do Espírito de Jesus, leva a conversão, que e a liberdade em Deus.