segunda-feira, 26 de maio de 2014

ASCENSÃO DO SENHOR - ANO A



O DESTINO DO HOMEM NOVO


1ª Leitura At 1,1-11 – 2ª Ef 1,17-23 – Ev. Mt 28,16-20

 

Interpretando teologicamente a Ascensão de Jesus, recomendam os anjos que não fique a olhar o céu, mas que se espere e prepare a volta gloriosa do Senhor. Esta é, até o fim dos tempos, a missão da Igreja, em tensão entre o visível é o invisível, entre a realidade presente e a futura cidade para qual caminhamos.


O homem à direita de Deus


A fórmula do nosso Creio: “Ressuscitou, subiu aos céus, está sentado à direita do Pai”, exprime a fé pessoa da Igreja no destino de Jesus de Nazaré. Este homem, com o qual os apóstolos “comeram e beberam” durante sua existência terrena, “torno-se Senhor” depois de sua morte porque o Pai o associou definitivamente à sua vida, ao seu poder sobre os homens e sobre o mundo: “Todo poder me foi dado no céu e na terra” (evangelho ano A). Vivo, depois de sua paixão (1ª leitura), está ele presente entre os seus numa dimensão, e anda com eles nos caminhos do mundo, aonde os envia como testemunha da ressurreição, anunciadores do perdão dos pecados e da vida de filhos de Deus, portadores da força do Espírito que reúne os homens e todas as nações na única Igreja. Com a fé e o batismo, todos os homens entram na nova dimensão do Ressuscitado, pensam e buscam “as coisas do alto, onde Cristo está sentado á direita de Deus”, participam, como membros do corpo de Cristo, da “plenitude daquele que completa inteiramente todas as coisas” (2ª leitura).

Pensando nesta realidade, podem-se compreender as expressões de entusiasmo dos antigos cristãos: “A ascensão do Cristo é a nossa ascensão; já que o Corpo é convidado a elevar-se até a glória em que precedeu a cabeça, vamos cantar nossa alegria expandir em ação de graças todo nosso júbilo. Hoje, não apenas conquistamos o paraíso, mas, no Cristo, penetramos nos mais altos céus”.


O céu é Alguém


Afirmar que a humanidade na pessoa do Cristo, já esta no céu, significa contestar as imagens espontâneas de um céu “espacial”, e a de uma felicidade eterna que começaria repentinamente, depois desta vida no tempo. Para Jesus, o céu é a participação plena da vida de Deus, de um homem verdadeiro, possuindo a mesma matéria e a mesma história de todo nós; uma relação nova entre o Criador e a criatura numa total transparência, livre dos limites e das dificuldades da condição terrena.  Pra nós será assim um dia, quando se manifestar abertamente aquilo que já somos; pelo conhecimento e o amor. O corpo não for mais obstáculo, mas perfeito meio de comunicação. Um céu assim não simplesmente a “recompensa” de uma vida justa e boa, porque “os sofrimentos do momento presente não são comparáveis com a glória futura que será revelada em nós. Nem tampouco um narcótico para pessoas passivas e resignadas, um álibi para o compromisso de trabalhar neste mundo pela realização daqueles valore de liberdade, justiça, paz, fraternidade, comunhão, vida, amor. Alegria, que constitui a bem-aventurança do homem completo segundo o plano de Deus. Uma comunidade dos que crêem e caminham nesta direção – isto é, aberta ao mundo, a serviço de todos – torna-se testemunha da nova humanidade realizada em Cristo Jesus.   


Realidade terrestre e engajamento dos que crêem


Um novo equilíbrio a ser encontrado: “Somos advertidos, com efeito, de que não adianta ao homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder a si mesmo. Contudo, a esperança de uma nova terra, longe de atenuar, antes deve estimular a solicitude pelo aperfeiçoamento desta terra. Nela cresce o Corpo da nova família humana que já pode apresentar algum esboço do novo século. Por isso, ainda que o progresso terreno deva ser cuidadosamente distinguido do aumento do Reino de Cristo, contudo é de grande interesse par o Reino de Deus, na medida em que pode contribuir para organizar a sociedade humana”.

terça-feira, 20 de maio de 2014

6º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A


Primeira Leitura: At 8,5-8.14-17 
Impuseram-lhes as mãos, e eles receberam o Espírito Santo.

A morte de Estêvão foi o estopim para que em Jerusalém explodisse a perseguição contra os cristãos de cultura grega, à frente dos quais estava o próprio Estêvão. Por causa dela, os fiéis se dispersaram. Lucas vê nesse fato a chance providencial que a comunidade tem de levar o anúncio da palavra de Deus aos que ainda não a conhecem. Se em Jerusalém o anúncio provocou perseguição, na Samaria suscitará contentamento. Temos aqui uma das grandes forças da palavra de Deus: a capacidade de confraternizar povos inimigos (compare com Lc 9,51ss). De fato, judeus e samaritanos detestavam-se mutuamente. Agora, a Samaria acolhe o anúncio da Palavra, feito por intermédio de Filipe, um dos sete ministros (8,5; cf. 6,5).
Filipe é apresentado como modelo de evangelizador que sai de Jerusalém para levar o testemunho a todos (cf. 1,8). Fica, assim, caracterizado o tipo da comunidade evangelizadora: a que não põe fronteiras ao trabalho pastoral. A missão do evangelizador é prolongamento do que Jesus disse e fez. Consta de anúncio e de fatos. Filipe anuncia o Cristo (v. 5) e realiza milagres (v. 6). As duas atividades estão unidas entre si. Anunciar o Cristo é já mostrá-lo presente na ação concreta. Por isso, a pregação de Filipe é acompanhada pela expulsão dos espíritos maus e pela cura de paralíticos e aleijados (como fez o próprio Jesus). Em outras palavras, anunciar o Cristo é eliminar tudo o que aliena e despersonaliza o ser humano (demônios), dando às pessoas condições para que assumam responsavelmente a própria caminhada (cura dos paralíticos e aleijados). O clima que esses acontecimentos suscita é o da alegria messiânica (cf. 2,46; Lc 2,10), que contagia a quantos aceitam Jesus como o Libertador e Senhor de suas vidas (v. 8).
A Igreja de Jerusalém toma conhecimento do que a palavra de Deus realizou na Samaria. E envia para lá Pedro e João (v. 14). Sua tarefa é completar a evangelização mediante a oração e a imposição das mãos. Os samaritanos recebem o Espírito Santo. No plano de Lucas, realiza-se o Pentecostes dos pagãos (os samaritanos eram considerados pagãos pelos judeus). O Espírito vai conduzindo a evangelização, fazendo que muitos povos se integrem ao único povo messiânico. O Espírito não é propriedade dos apóstolos. Estes, sim, são servos do Espírito, pois ele os conduz e impulsiona. Assim, de acordo com At 1,8, os discípulos de Jesus se tornam testemunhas na Judéia (Jerusalém), na Samaria e até nos confins do mundo (o resto do livro dos Atos), pois o Espírito da Verdade (cf. evangelho) é o dinamismo da comunidade cristã missionária.                                              
Segunda Leitura: 1Pd 3,15-18 
Sofreu a morte na sua existência humana, mas recebeu nova vida pelo Espírito.
Os vv. 13-14, apesar de não constarem no texto lido hoje, ajudam na compreensão do contexto. 'Quem lhes fará mal, se vocês se esforçam em fazer o bem? Se sofrem por causa da justiça, felizes de vocês! Não tenham medo deles, nem fiquem assustados'. Pedro escreve a cristãos que sofrem (cf. II leitura do domingo passado). Os sofrimentos daquelas comunidades da Ásia Menor tinham duas causas: em primeiro lugar, a situação social em que viviam – eram migrantes, trabalhadores, escravos; em segundo lugar, a luta que sustentavam – queriam que fosse feita justiça, que seus direitos e dignidade fossem reconhecidos. Por causa disso eram vistos como subversivos.
Pedro lhes diz que, se sofrem por causa da justiça, são felizes (v. 14). É a concretização da bem-aventurança anunciada por Jesus (cf. Mt 5,10). Não são bem-aventurados pelo sofrimento em si. O sofrimento não faz ninguém feliz! São bem-aventurados por causa da motivação profunda que anima sua luta: a justiça que visa criar o reino de Deus, o projeto de Deus.
Pedro anima as comunidades, dizendo-lhes que não devem ter medo dos que as consideram subversivas e arrastam seus membros aos tribunais. Pelo contrário, devem 'santificar em seus corações o Senhor Jesus Cristo', ou seja, reconhecer de coração (plena e absolutamente) que o único Senhor é Jesus! Essa motivação deve estar sempre presente e animar todas as esperanças e anseios das pessoas (v. 15).
Bons modos, respeito e consciência limpa são os instrumentos para a conquista da justiça (v. 16a), resposta que desarma a grosseria, a violência e a corrupção dos que fomentam a injustiça. Temos aqui o ideal da não-violência ativa (cf. Mt 5,38-40), capaz de fazer ruir a sociedade injusta (v. 16b).
A norma de comportamento cristão é a prática de Jesus (v. 18). O justo morreu pelos injustos, a fim de os conduzir a Deus. Contudo, a morte de Jesus não quer dizer que a injustiça tenha vencido. Pelo contrário, da morte nasceu a vida nova do Espírito Santo. Esse mesmo Espírito é que age agora nos fiéis, levando-os à prática de Jesus. Fazendo o que ele fez, os cristãos oferecem sua colaboração indispensável na construção do reino de Deus. Esse reino é o ideal proposto por Deus, que coincide com os profundos anseios da humanidade sedenta de justiça, liberdade e dignidade reconhecida.
O v. 17 não pretende atribuir a Deus a vontade de fazer sofrer as pessoas. De fato, ele não sente prazer no sofrimento humano. O próprio Jesus o demonstrou. O sofrimento diminui o ser de Deus presente nas pessoas. Contudo, o projeto de Deus sabe valorizar o sofrimento. Do sofrimento nasce o desejo de liberdade e vida. E Deus o transforma em energia que supera as injustiças que o provocam.

Evangelho: Jo 14,15-21 
Eu rogarei ao Pai e ele vos dará outro Defensor.
Num contexto de ódio e de perseguição, a promessa feita por Jesus de dar aos discípulos o Espírito da Verdade reveste-se de suma importância. Foi a forma de protegê-los contra o erro e a mentira, ciladas montadas pelo mundo para desviá-los do bom caminho. Sem esta ajuda salutar, com muita probabilidade, deixar-se-iam levar pelas sugestões do falso espírito, chegando a renegar sua condição de discípulos. Pois, enquanto o Espírito da Verdade conduz ao Deus verdadeiro, o espírito da mentira conduz aos falsos deuses, aos ídolos.
O Espírito é designado como Paráclito, ajudante dos discípulos de Jesus. Assim, não seriam deixados à própria sorte, numa espécie de perigosa orfandade. A presença do Espírito de Verdade junto deles daria continuidade à de Jesus. Eles teriam sempre a quem recorrer, pois o Espírito estaria neles e "com eles para sempre".

A comunidade cristã sempre correria o sério risco de ser levada pelo espírito da mentira. Por isso, precisava da presença constante do Espírito da Verdade para manter-se sempre no bom caminho. Quanto maior esse risco, tanto mais necessária fazia-se a presença desse Espírito que conduz à verdade e à vida. Ele haveria de ser uma luz a expulsar as trevas, de modo a permitir aos discípulos caminhar com segurança rumo à casa do Pai.



terça-feira, 6 de maio de 2014

4º DOMINGO DA PÁSCOA

JESUS RESSUSCITADO MANIFESTA-SE NOS PASTORES DA IGREJA



1ª LEITURA  – Atos 2,14a.36-41-  O texto de Atos traça, de forma bastante completa, o percurso que Cristo, “o Pastor”, desafia os homens a percorrer: é preciso converter-se (isto é, deixar os esquemas de escravidão), ser batizado (isto é, aderir a Jesus e segui-lo) e receber o Espírito Santo para assumir a vocação própria de cada pessoa – (assumir a vocação é acolher a vida de Deus e deixar-se recriar, vivificar e transformar por ela).

2ª LEITURA – 1 Pedro 2,20b-25 A segunda leitura apresenta-nos também Cristo como “o Pastor” que guarda e conduz as suas ovelhas. No contexto concreto em que a leitura nos coloca, seguir “o Pastor” é também assumir a vocação, que é uma resposta à injustiça com o amor, ao mal com o bem. Enquanto o mundo apregoa que cada um cuide de si, os cristãos se dispõem a cuidar dos filhos dos outros na catequese, a preparar liturgias para famílias, a cuidar das coisas da Igreja e da salvação de todos que estão à nossa volta.

EVANGELHO – João 10,1-10 – O Evangelho apresenta Cristo como “o Pastor”, cuja vocação é libertar o rebanho de Deus do domínio da escravidão e levá-lo ao encontro das pastagens verdejantes onde há vida em plenitude (ao contrário dos falsos pastores, cujo objetivo é só aproveitar-se do rebanho em benefício próprio). Jesus vai cumprir com amor essa missão, no respeito absoluto pela identidade, individualidade e liberdade das ovelhas.

Deus não se conforma com o pecado humano e jamais desisti de buscar a salvação da humanidade. Por isso ele, tal como um Bom Pastor, vai ao encontro das ovelhas e busca curar aquelas feridas pelas consequências do pecado. Daí vem o convite divino:  “Convertei-vos”.  Converter-se é deixar os velhos esquemas de egoísmo, de prepotência, de orgulho, de autossuficiência que tantas vezes constituem o cenário privilegiado em que se desenrola a vida, para ir atrás de Jesus e aprender com Ele a viver a vocação específica de cada um de nós: amar, servir, dar a vida.  Diante do amor divino, o salmista diz: O Senhor é meu pastor: nada me faltará. Por isso, quem ouve a voz do Pastor da Vida, passa a viver a vocação alimentada pelo amor divino, isto é: responder à injustiça com o amor, ao mal com o bem.
Jesus, afirma que é o Pastor, mas afirma também que é a PORTA das ovelhas. Podemos refletir que ao passar por esta PORTA os cristãos não ficam confinados. Lembremo-nos que Jesus chama os discípulos, os acolhe e os ensina para depois enviá-los em missão. Por isso, podemos pensar a Igreja como um templo de quatro portas. Duas delas são portas de entrada e outras duas são portas de saída. As portas de entrada são: 1- A porta do mistério; 2- A porta da instituição. Cada um de nós pode entrar por uma destas portas. Pela porta do mistério entram as pessoas quando são tocadas pela dor ou pelo amor. A porta da instituição acolhe as pessoas que são batizadas ainda crianças e que jamais abandonam a fé.  
Já as portas de saída são: 3- a porta da missão; 4- a Porta do Reino. Tanto as pessoas que foram motivadas a entrar pelo mistério ou pela tradição da fé familiar, também são convidadas a sair pelas portas da Missão e do Reino. A porta da Missão nos leva a anunciar a graça de Cristo ao mundo. A porta do Reino nos leva a lutar contra as forças do mal e, muitas vezes, colocarmos até a própria vida em risco, como é o caso de tantos mártires. A Igreja cumpre a sua missão graças àqueles, aceitando o convite de Jesus, entram pelas portas do Mistério ou da Instituição e que, saindo pelas portas da Missão ou do Reino, vivem a vocação exercida nas diversas dimensões da evangelização. Talvez o grave problema de muitas comunidades seja que pessoas entram na Igreja, mas não aceitam viver a própria vocação fora ou dentro dela.