segunda-feira, 17 de agosto de 2015

SÓ TU TENS PALVRAS DE VIDA ETERNA!

21º DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO B

Js 24,1-2a.15-17. 18b; Salmo 33 (34); Ef 5,21-32; Jo 6,60-69

A liturgia do 21º Domingo do Tempo Comum fala-nos de opções. Recorda-nos que a nossa existência pode ser gasta a perseguir valores efêmeros e estéreis, ou a apostar nesses valores eternos que nos conduzem à vida definitiva, à realização plena. Cada homem e cada mulher têm, dia a dia, de fazer a sua escolha.
Na primeira leitura, Josué convida as tribos de Israel reunidas em Siquém a escolherem entre “servir o Senhor” e servir outros deuses. O Povo escolhe claramente “servir o Senhor”, pois viu, na história recente da libertação do Egito e da caminhada pelo deserto, como só Jahwéh pode proporcionar ao seu Povo a vida, a liberdade, o bem estar e a paz.
O Evangelho coloca diante dos nossos olhos dois grupos de discípulos, com opções diversas diante da proposta de Jesus. Um dos grupos, prisioneiro da lógica do mundo, tem como prioridade os bens materiais, o poder, a ambição e a glória; por isso, recusa a proposta de Jesus. Outro grupo, aberto à ação de Deus e do Espírito, está disponível para seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida; os membros deste grupo sabem que só Jesus tem palavras de vida eterna. É este último grupo que é proposto como modelo aos crentes de todos os tempos
Na segunda leitura, Paulo diz aos cristãos de Éfeso que a opção por Cristo tem consequências também ao nível da relação familiar. Para o seguidor de Jesus, o espaço da relação familiar tem de ser o lugar onde se manifestam os valores de Jesus, os valores do Reino. Com a sua partilha de amor, com a sua união, com a sua comunhão de vida, o casal cristão é chamado a ser sinal e reflexo da união de Cristo com a sua Igreja.

Js 24,1-2a.15-17.18b

MENSAGEM

Estamos, portanto, em Siquém, com “todas as tribos de Israel” (vers. 1) reunidas à volta de Josué. Na interpelação que dirige às tribos, Josué começa por elencar alguns momentos capitais da história da salvação, mostrando ao Povo como Jahwéh é um Deus em quem se pode confiar; as suas ações salvadoras e libertadoras em favor de Israel são uma prova mais do que suficiente do seu poder e da sua fidelidade (cf. Js 24,2-13).
Depois dessa introdução, Josué convida os representantes das tribos presentes a tirarem as devidas consequências e a fazerem a sua opção. É necessário escolher entre servir esse Senhor que libertou Israel da opressão, que o conduziu pelo deserto e que o introduziu na Terra Prometida, ou servir os deuses dos mesopotâmios e os deuses dos amorreus. Josué e a sua família já optaram: eles escolheram servir Jahwéh (vers. 15).
A resposta do Povo é a esperada. Todos manifestam a sua intenção de servir o Senhor, em resposta à sua ação libertadora e à sua proteção ao longo da caminhada pelo deserto (vers. 16-18). Israel compromete-se a renunciar a outros deuses e a fazer de Jahwéh o seu Deus.
A aceitação de Jahwéh como Deus de Israel é apresentada, não como uma obrigação imposta a um grupo de escravos, mas como uma opção livre, feita por pessoas que fizeram uma experiência de encontro com Deus e que sabem que é aí que está a sua realização e a sua felicidade. Depois de percorrer com Jahwéh os caminhos da história, Israel constatou, sem margem para dúvidas, que só em Deus pode encontrar a liberdade e a vida em plenitude.

Salmo 33 (34)
Ef 5,21-32

MENSAGEM

O nosso texto começa com um princípio geral que deve regular as relações entre os diversos membros da família cristã: “sede submissos uns aos outros no temor de Cristo” (Ef 5,21). O “ser submisso” expressa aqui a condição daquele que está permanentemente numa atitude de serviço simples e humilde, sem deixar que a sua relação com o irmão seja dominada pelo orgulho ou marcada por atitudes de prepotência. A expressão “no temor de Cristo” recorda aos crentes que o Cristo do amor, do serviço, da partilha é o exemplo e o modelo que eles devem ter sempre diante dos olhos.
Depois, Paulo dirige-se aos vários membros da família e propõe-lhes normas concretas de conduta. O texto que nos é proposto, contudo, apenas conservou a parte que se refere à relação dos esposos um com o outro (na continuação, Paulo falará também da conduta dos filhos para com os pais, dos pais para com os filhos, dos senhores para com os escravos e dos escravos para com os senhores – cf. Ef 6,1-9).
Às mulheres, Paulo pede a submissão aos maridos, porque “o marido é a cabeça da mulher, como Cristo é a cabeça da Igreja, seu corpo” (vers. 23). Esta afirmação – que, à luz da nossa sensibilidade e dos nossos esquemas mentais modernos parece discriminatória – deve ser entendida no contexto sócio-cultural da época, onde o homem aparece como a referência suprema da organização do núcleo familiar. De qualquer forma, a “submissão” de que Paulo fala deve ser sempre entendida no sentido do amor e do serviço e não no sentido da escravidão.
Aos maridos, Paulo recomenda que amem as suas esposas, “como Cristo amou a Igreja e Se entregou por ela” (vers. 25). Não se trata de um amor qualquer, mas de um amor igual ao de Cristo pela sua comunidade – isto é, de um amor generoso e total, que é capaz de ir até ao dom da própria vida. Para Paulo, portanto, o amor dos maridos pelas esposas deve ser um amor completamente despido de qualquer sinal de egoísmo e de prepotência; e deve ser um amor cheio de solicitude, que se manifesta em atitudes de generosidade, de bondade e de serviço, que se faz dom total à pessoa a quem se ama.
Neste contexto, Paulo desenvolve a sua teologia da relação entre Cristo e a Igreja, para depois tirar daí as devidas consequências para a união dos esposos cristãos… Cristo santificou a Igreja, purificando-a “no batismo da água pela palavra da vida” (vers. 26). Há aqui, certamente, uma alusão ao batismo cristão (inspirada, provavelmente, nas cerimônias preparatórias do matrimônio, que contemplavam o “banho” da noiva antes de se apresentar diante do noivo), pelo qual Cristo edifica a sua comunidade e a purifica do pecado. O Batismo é o momento em que Cristo oferece a vida plena à sua Igreja e em que a Igreja se compromete com Cristo numa comunidade de amor. A partir desse momento, Cristo e a Igreja formam um só corpo… Como Cristo e a Igreja formam um só corpo, do mesmo modo marido e esposa, comprometidos numa comunidade de amor, formam um só corpo: “por isso, o homem deixará pai e mãe para se unir à sua mulher e serão dois numa só carne” (vers. 31). A expressão “uma só carne” aqui usada por Paulo não alude só à união carnal dos esposos, mas a toda a sua vida conjugal, feita de um empenho quotidiano na vivência do amor, da fidelidade e da partilha de toda a existência.
Este paralelismo estabelecido por Paulo entre a união de Cristo e da Igreja e o amor que une os esposos dá um significado especial ao casamento cristão: a vocação dos esposos é anunciar e testemunhar, com o seu amor e a sua união, o amor de Cristo pela sua Igreja. Dito de outra forma: a união dos esposos cristãos deve ser, aos olhos do mundo, um sinal e um reflexo do “mistério” de amor que une Cristo e a Igreja.

Jo 6,60-69

A perícopa divide-se em duas partes. A primeira (vers. 60-66) descreve o protesto de um grupo de discípulos face às exigências de Jesus; a segunda (vers. 67-69) apresenta a resposta dos Doze à proposta que Jesus faz. Estes dois grupos (os “muitos discípulos” da primeira parte e os “Doze” da segunda parte) representam duas atitudes distintas face a Jesus e às suas propostas.
Para os “discípulos” de que se fala na primeira parte do nosso texto, a proposta de Jesus é inadmissível, excessiva para a força humana (vers. 60). Eles não estão dispostos a renunciar aos seus próprios projetos de ambição e de realização humana, a embarcar com Jesus no caminho do amor e da entrega, a fazer da própria vida um serviço e uma partilha com os irmãos. Esse caminho parece-lhes, além de demasiado exigente, um caminho ilógico. Confrontados com a radicalidade do caminho do Reino, eles não estão dispostos a arriscar.
Na resposta à objeção desses “discípulos”, Jesus assegura-lhes que o caminho que propõe não é um caminho de fracasso e de morte, mas é um caminho destinado à glória e à vida eterna. A “subida” do Filho do Homem, após a morte na cruz, para reentrar no mundo de Deus, será a “prova provada” de que a vida oferecida por amor conduz à vida em plenitude (vers. 61-62). Esses “discípulos” não estão dispostos a acolher a proposta de Jesus porque raciocinam de acordo com uma lógica humana, a lógica da “carne”; só o dom do Espírito possibilitará aos crentes perceber a lógica de Jesus, aderir à sua proposta e seguir Jesus nesse caminho do amor e da doação que conduz à vida (vers. 63).
Na realidade, esses discípulos que raciocinam segundo a lógica da “carne” seguem Jesus pelas razões erradas (a glória, o poder, a fácil satisfação das necessidades materiais mais básicas). A sua adesão a Jesus é apenas exterior e superficial. Jesus tem consciência clara dessa realidade. Ele sabe até que um dos “discípulos” O vai trair e entregar nas mãos dos líderes judaicos (vers. 64). De qualquer forma, Jesus encara a decisão dos discípulos com tranquilidade e serenidade. Ele não força ninguém; apenas apresenta a sua proposta – proposta radical e exigente – e espera que o “discípulo” faça a sua opção, com toda a liberdade.
Em última análise, a vida nova que Jesus propõe é um dom de Deus, oferecido a todos os homens (vers. 65). O termo deste movimento que o Pai convida o “discípulo” a fazer é o encontro com Jesus e a adesão ao seu projecto. Se o homem não está aberto à acção do Pai e recusa os dons de Deus, não pode integrar a comunidade dos discípulos e seguir Jesus.
A primeira parte da cena termina com a retirada de “muitos discípulos” (vers. 66). O programa exposto por Jesus, que exige a renúncia às lógicas humanas de ambição e de realização pessoal, é recusado… Esses “discípulos” mostram-se absolutamente indisponíveis para percorrer o caminho de Jesus.
Confirmada a deserção desses “discípulos”, Jesus pede ao grupo mais restrito dos “Doze” que façam a sua escolha: “também vós quereis ir embora?” (vers. 67). Repare-se que Jesus não suaviza as suas exigências, nem atenua a dureza das suas palavras… Ele está disposto a correr o risco de ficar sem discípulos, mas não está disposto a prescindir da radicalidade do seu projecto. Não é uma questão de teimosia ou de não querer dar o braço a torcer; mas Jesus está seguro que o caminho que Ele propõe – o caminho do amor, do serviço, da partilha, da entrega – é o único caminho por onde é possível chegar à vida plena… Por isso, Ele não pode mudar uma vírgula ao seu discurso e à sua proposta. O caminho para a vida em plenitude já foi claramente exposto por Jesus; resta agora aos “discípulos” aceitá-lo ou rejeitá-lo.
Confrontados com esta opção fundamental, os “Doze” definem claramente o caminho que querem percorrer: eles aceitam a proposta de Jesus, aceitam segui-l’O no caminho do amor e da entrega. Quem responde em nome do grupo (uso do plural) é Simão Pedro: “Para quem iremos nós, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna” (vers. 68). A comunidade reconhece, pela voz de Pedro, que só no caminho proposto por Jesus encontra vida definitiva. Os outros caminhos só geram vida efêmera e parcial e, com frequência, conduzem à escravidão e à morte; só no caminho que Jesus acabou de propor (e que “muitos” recusaram) se encontra a felicidade duradoura e a realização plena do homem (vers. 68).
É porque reconhece em Jesus o único caminho válido para chegar à vida eterna que a comunidade dos “Doze” adere ao que Ele propõe (“cremos” – vers. 69a). A “fé” (adesão a Jesus) traduz-se no seguimento de Jesus, na identificação com Ele, no compromisso com a proposta que Ele faz (“comer a carne e beber o sangue” que Jesus oferece e que dão a vida eterna).
A resposta posta na boca de Pedro é precisamente a resposta que a comunidade joânica (a tal comunidade que vive a sua fé e o seu compromisso cristão em condições difíceis e que, por vezes, tem dificuldade em renunciar à lógica do mundo e apostar na radicalidade do Evangelho de Jesus) é convidada a dar: “Senhor, as tuas propostas nem sempre fazem sentido à luz dos valores que governam o nosso mundo; mas nós estamos seguros de que o caminho que Tu nos indicas é um caminho que leva à vida eterna. Queremos escutar as tuas palavras, identificar-nos contigo, viver de acordo com os valores que nos propões, percorrer contigo esse caminho do amor e da doação que conduz à vida eterna.

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